Anomalia climática de 2014 tende a se repetir neste ano
O café tem, em 2019, um ano de bianualidade baixa. A cultura da variedade arábica, que é a plantada em Garça, se caracteriza por um ano de produção mais vigorosa e outro ano em que a planta naturalmente "repõe suas energias", ofertando um volume menos efetivo de grãos. Assim, a expectativa dos cafeicultores era de que, a partir de maio, a colheita não fosse das mais consistentes, entretanto, a baixa que é registrada em muitas lavouras tem sido bem mais profunda.
O que se observou foi um período considerável de seca ao longo de 2018 e isso agora está refletindo nas lavouras. Entre maio e agosto do ano passado, praticamente nenhum milímetro de chuva foi registrado em Garça e região e as temperaturas ficaram acima da média, com o inverno praticamente não tendo dias de frio mais intenso.
Esse quadro anormal fez com que as plantas tivessem uma mudança mais significativa em seu comportamento. O período de floração foi marcado por um volume menor de botões e agora isso reflete nos frutos, que são escassos nos ramos.
Alguns produtores e especialistas avaliam que as lavouras garcenses deverão ter uma redução de produção de pelo menos 30%. Tal fato ainda se torna mais dramático diante dos preços, que continuam muito baixos e que, em muitos casos, nem sequer cobrem o custo de produção.
Segundo José Roberto Marques da Costa, de Agnocafé, maior site brasileiro de notícias sobre o segmento café, o clima vem sendo um fator determinante para o setor cafeeiro. Ele lembrou que, além dos problemas observados no ano passado, neste momento também há um cenário diferenciado, com chuvas irregulares em várias regiões produtoras e com um calor excessivo. Em Garça, lembrou Costa, já se verifica uma maturação acelerada dos grãos, o que poderá fazer com que a colheita seja adiantada, podendo mesmo ser iniciada em abril em algumas propriedades.
José Roberto Marques da Costa apontou que ainda há o temor de que uma anomalia parecida com a crise hídrica de 2014/2015 possa se repetir no Sudeste. O Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais) revelou que essa região, desde o fim de dezembro, apresenta um padrão de chuvas abaixo e temperaturas acima da média, algo também verificado em partes do Centro-oeste e do Nordeste.
Esse Centro sustentou que a anomalia deverá persistir nas próximas semanas e, caso se prolongue por mais tempo, poderá agravar a situação dos reservatórios do Sudeste. Satélites e modelos meteorológicos mostram que alguma coisa está fora de ordem. Mas não há ainda explicação para o fenômeno. O El Niño, que costuma ser apontado como o causador de muitas divergências climáticas, desta vez não está bem configurado e, por si só, não explica as anomalias, segundo indicou o Cemaden.
A realidade é que a área de alta pressão atmosférica que costuma permanecer no Atlântico junto ao Nordeste — e que leva secura ao Semiárido — se deslocou em direção ao sul e estendeu sua influência Brasil adentro. Segundo o Centro, essa área começou a se formar no fim dezembro e entrou em janeiro com força.
A alta pressão é uma exterminadora de nuvens de chuva e um aquecedor do ar. Ela inibe a chuva e, assim, faz a temperatura disparar. Faz isso ao secar a atmosfera e empurrar para baixo o ar quente. As nuvens que se formam por convecção devido ao calor do dia são esmagadas e sugadas. O resultado é a formação de uma estufa, com um calor dos mais sufocantes.
O sistema de alta pressão também bloqueia a entrada de frentes frias. Isso não significa que não chova. Quando algum sistema de tempestade consegue sobreviver à alta pressão, gera chuvas curtas, localizadas, mas que podem ser extremamente violentas, como destacou o Cemaden.
O mesmo padrão climático que castiga o Brasil também se repete neste momento na Austrália, onde a única chuva em alguns lugares é a de morcegos, mortos pelo calor sem trégua. Outros dois sistemas estão ativos no Índico e no Pacífico. É um padrão que trava a circulação atmosférica. E é difícil saber agora por quanto tempo vai perdurar e que mudança na dinâmica entre oceanos e atmosfera é de fato a causa.
Diante de mais um problema climático, os produtores de café de Garça e região vão tendo de enfrentar árvores com quantidades pouco amistosas de grãos, ao mesmo tempo em que continuam a se desanimar com os preços do grão, que nos últimos tempos vão tendo dificuldade de bater os R$ 400 a saca.