Denúncia de sonegação milionária no mercado de café capixaba
Quatro entidades capixabas assinam uma nota no qual denunciam uma sonegação na ordem de R$ 150 a R$ 200 milhões nos impostos do mercado de café capixba,
O Centro do Comércio de Café de Vitória, Centro de Desenvolvimento Tecnológico do Café (CETCAF) a Federação da Agricultura do Espírito Santo e o Sindicato e Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB-ES) afirmam que o Espírito Santo é o maior produtor de café conilon do país, colhendo, geralmente 70% da produção nacional dessa espécie.
Segundo as entidades, o conilon atende, na forma de café solúvel, à 4 milhões de sacas destinadas à exportação e cerca de 1 milhão de sacas no mercado interno. Também no consumo interno, à 45% dos cafés “torrado e moído”.
No entanto, o Espírito Santo é o único estado produtor que pratica a alíquota diferenciada, sem justificativa plausível, entre conilon e arábica para os cafés destinados para as regiões Norte e Nordeste. “Enquanto os demais estados adotam alíquota única de 7% para arábica e conilon, o Espírito Santo pratica alíquotas diferenciadas, da ordem de 7% para o arábica e 12% para o conilon. Tal prática para o conilon torna, portanto, o estado do Espírito Santo menos competitivo frente aos demais e, sem sombra de dúvida, estimula a sonegação”.
As entidades afirmam que o atual Secretário da Fazenda do Espírito Santo (Sefaz-ES), Rogelio Amorim, em reunião, disse que a razão dessa diferença de alíquotas entre arábica e conilon assenta-se no que eles consideram “falsa e cômoda presunção de que, sendo o Espírito Santo o principal fornecedor dessa espécie de café, as indústrias teriam que comprar de produtores daqui o conilon”.
Este posicionamento, dizem, “tem estimulado ainda mais a sonegação de ICMS e as consequências vão além, indicando uma outra ameaça iminente à principal atividade agrícola capixaba: outros estados estão incentivando o plantio de conilon, tendo inclusive, segundo informações, já recebido transferência de banco genético” e que um “importante veículo de comunicação do setor cafeeiro dá conta de que pesquisas aprofundadas estão sendo desenvolvidas nesse sentido pelo estado de Minas Gerais".
Dassa forma, afirmam que “cabe alertar que, em um futuro breve, o estado do Espírito Santo pode perder a hegemonia na produção de conilon. Vide o exemplo do Vietnam”.
As práticas implantadas pelos últimos governos, entre elas diferença de alíquotas, fechamento de postos de fiscalização de fronteira com outros estados produtores, facilidade para se obter as autorizações para funcionamento de uma empresa de café sem se comprovar a existência de estrutura física disponível para movimentar grandes volumes, são alguns dos fatores que facilitam a atuação de sonegadores no comércio de café do Espírito Santo, dizem as corporações.
Também afirmam que foi avisado, tanto ao atual Governo Estadual, quanto aos anteriores, que, a cada safra, é estimado que milhões de sacas de conilon são negociadas de forma irregular, ocorrendo muitas vezes, a descaracterização do estado produtor e simulando que tal volume estaria sendo produzido por outros estados.
“Portanto, não somente o ICMS é sonegado, mas também, em muitos casos, o próprio valor da mercadoria não estaria sendo contabilizado de forma regular. Não nos surpreenderá se, fisicamente, o café objeto de tamanha sonegação, conforme investigado na “Operação Expresso” for, em grande maioria, o conilon capixaba”.
Dizem que embora a nota tome por base somente o conilon, não resta dúvidas que também ocorre significativa sonegação com o café arábica produzido no Espírito Santo. E que em fevereiro de 2021, após ter sido demandada formalmente pela Assembleia Legislativa do Espírito Santo (Ales) em decorrência de cobranças do setor privado, a Sefaz-ES apresentou os números oficiais de arrecadação do ICMS e a estimativa de quanto é sonegado na comercialização de café. No entanto, os números oficiais estão muito aquém do que o mercado estima.
Cálculo
Para explica a sonegação, as corporações explicam o seguinte: considerando que o Espírito Santo produz 70% de todo conilon produzido no Brasil, a cada safra, cerca de 9 milhões de sacas produzidas aqui são destinadas para outros estados e, portanto, sobre esse volume, deve incidir ICMS com base no seguinte estudo: 70% do conilon processado pelas indústrias de torrado & moído e de café solúvel estabelecidas fora do estado.
Este volume é estimado em 9,5 milhões de sacas (considerando um consumo interno total de 21 milhões, dos quais 45% é conilon – ou seja, 9,5 milhões de sacas – e somando 3,6 milhões de sacas de solúvel para exportação produzidos pelas indústrias fora do estado, totalizando 13 milhões de sacas de conilon dos quais 70% é conilon capixaba, o que significa cerca de 9 milhões de sacas).
Portanto, a expectativa de arrecadação de ICMS pelo Espírito Santo na comercialização de café conilon deveria ser baseada na venda de cerca de 9 milhões de sacas, equivalentes as seguintes cifras:
Com os valores de arrecadação reportados pela Sefaz-ES, afirmam as entidades, não foi possível saber qual é o montante referente à arrecadação em espécie e qual é referente aos créditos tributários, tendo em vista que há dúvidas sobre a real validade de parte desses créditos.
“Com este raciocínio, estimamos que no ano de 2020, por exemplo, a sonegação pode ter sido da ordem de 150 milhões a 200 milhões de reais. Para 2021, com a alta da cotação do café conilon – cerca de R$ 450 atualmente – a expectativa do Setor é que o Estado do Espírito Santo arrecade cerca de 550 milhões de reais somente com o conilon. Entretanto, não resta dúvida de que o apetite dos sonegadores será voraz e tememos que, infelizmente, mais uma vez, nada mais contundente seja feito”.
Operação
Por fim, as entidades afirmam que defendem a “Operação Expresso”, que investigou a sonegação de café no Espírito Santo, além do Paraná, Minas Gerais e São Paulo. E dizem que, na mesma linha, mais precisa ser feito pelas autoridades do Espírito Santo.
Sefaz-ES
Em nota assinada pelo secretario estadual da fazenda, Rogelio Pegoretti, a Sefaz-ES afirma que as informações são imprecisas. Disse que o comércio atacadista de café, no Espírito Santo, é um dos mais fiscalizados pela pasta.
Afirma que, nos últimos seis meses, por exemplo, foram feitas 46 auditorias com os seguintes propósitos: combater a falta de emissão de documentos fiscais, a utilização indevida de crédito de ICMS e o incorreto destaque de ICMS nas operações interestaduais, além de outras irregularidades do setor. Confira abaixo o restante da nota, na íntegra:
“Este número de ações fiscais no período citado corresponde, em média, 7 ações por mês. Ou seja, a cada 4 dias realiza-se uma ação fiscal no setor cafeeiro. Além disso, proporcionalmente, é o setor com mais empresas analisadas pelos auditores da Receita Estadual. Obviamente que a Sefaz entende que ainda há espaço para um maior rigor no combate à sonegação de impostos. No entanto, a Secretaria não pode concentrar seus esforços em um único setor.
As operações realizadas ao longo dos últimos seis meses redundaram na lavratura de autos de infração que, somados, superam R$ 155 milhões.
No que diz respeito à tributação, a Secretaria da Fazenda informa que a regra geral é a aplicação de uma alíquota de 12% nas mercadorias comercializadas de forma interestadual. Essa mesma alíquota é utilizada por 21 Estados brasileiros.
A redução de alíquota do café arábica de 12% para 7% foi um pleito do próprio segmento em 2017 e teve por objetivo substituir operações de exportação (que não são tributadas) por operações interestaduais.
Importante destacar que não há qualquer relação entre a alíquota e a sonegação no setor de café, tanto que se verifica o mesmo índice de não-conformidade nas operações com café arábica, que tem alíquota reduzida.
A motivação central do conteúdo veiculado na imprensa não está nas supostas sonegações e na suposta inoperatividade da Secretaria de Fazenda e de seus auditores fiscais, o que foi demonstrado não ser verdade, mas sim no pleito reiterado do setor, a fim de que alíquota do café conilon seja reduzida para 7%.
Quanto a isso, a Secretaria da Fazenda, com base em estudos técnicos, tem sustentado que, neste momento, não pode ser aplicado tal redução tarifária aos comerciantes de café conilon.
A título de comparação, em 2020 o Espírito Santo arrecadou R$ 309 milhões com a venda de café, sendo R$ 294 milhões referente ao tipo conilon e R$ 15 milhões referente ao tipo arábica. Caso fosse aplicada a alíquota de 7% nas operações interestaduais para as vendas com o café conilon, haveria uma perda de arrecadação de mais de 120 milhões, o que geraria sério impacto ao equilíbrio fiscal do estado e poderia prejudicar os investimentos em saúde, educação e segurança pública.
Acrescentamos, ainda, que não descartamos futuros debates sobre melhorias para o setor. Tais discussões, no entanto, devem ser organizadas num ambiente seguramente republicano, com exposição clara de ideias, informações verdadeiras, números reais, pontos e contrapontos – não por meio de conteúdos patrocinados em que só é repassado um ponto de vista e não há espaço para o contraditório”.